Opinião

A INCONSTITUCIONALIDADE DA SÚMULA 448, ITEM II, DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO.

28 de junho de 2023

Por Vitor Giollo Salles

A Justiça do Trabalho, não raras vezes, amparando-se em seus entendimentos sumulares, avoca para si a função legiferante e atua como legislador positivo, criando ou elastecendo direitos sem amparo legal, ao arrepio do art. 2º da Magna Carta.

Dentre as inúmeras súmulas na esteira, trataremos do tema da insalubridade prevista no item II da Súmula 448, do TST, que ao nosso entender, criou direito sem previsão legislativa.

Explica-se.

O art. 190 da CLT traduz a previsão de pagamento do adicional de insalubridade; contudo, evidencia que nem todas as atividades insalubres tem o condão de gerar a pretensão indenizatória decorrente da exposição aos agentes insalubres, mas, sim, somente aquelas constantes do quadro de atividades e operações insalubres definidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), a teor do item I da súmula 448 do TST, com a seguinte redação:

não basta a constatação da insalubridade por meio de laudo pericial para que o empregado tenha direito ao respectivo adicional, sendo necessária a classificação da atividade insalubre na relação oficial elaborada pelo Ministério do Trabalho”.

Pois bem.

A regulamentação do Ministério do Trabalho e Emprego, vigorante, prevê o pagamento do adicional de insalubridade, em seu grau máximo, para a atividade de coleta e industrialização de lixo urbano; entretanto, em nada menciona a limpeza de banheiros, independentemente do número de usuários.

Significa dizer que a previsão contida no item II da súmula 448 extrapola o alcance objetivo da norma legal ao estabelecer que a higienização de instalações sanitárias de uso público ou coletivo de grande circulação à respectiva coleta de lixo urbano, por não se equiparar à limpeza em residências e escritórios, ensejaria o pagamento do adicional de insalubridade em grau máximo, fundado no Anexo 14 da NR-15, da Portaria nº 3.214/78 do Ministério do Trabalho (coleta e industrialização de lixo urbano).

O item II, ao criar obrigação não prevista na relação de atividades e operações insalubres constantes no anexo 14 da NR-15, cria direito não previsto na legislação trabalhista, ao passo que a justificativa fática para o deferimento do adicional de insalubridade, também, não se sustenta, pois o contato com os agentes perniciosos haveria de ser permanente.

Desta forma, entende-se que o TST, contrariamente ao que tinha estabelecido no item I da própria súmula por ele editada e em confronto à Súmula 460, do STF, simplesmente legislou em substituição à competência do MTE, dispondo a respeito da classificação e do enquadramento da atividade insalubridade quanto à higienização e coleta de lixo das instalações sanitárias de uso público e coletivo de grande circulação.

Há em tais casos a aplicação de uma analogia sem a presença do requisito da permanência do Anexo 14 da NR 15, pois, o adicional de insalubridade em grau máximo somente é devido quando há contato direto e permanente do empregado com esgotos (galerias e tanques) e lixo urbano (coleta e industrialização), ainda que o parâmetro adotado pela referida NR seja o qualitativo e não quantitativo.

Permanente, na etimologia da palavra, é o que se dá de forma definitiva, duradoura, continuada, que não sofre mudanças, o que obviamente não ocorria com as atividades que uma auxiliar de limpeza realiza, haja vista a diversificação de serviços que não envolvem apenas a limpeza de banheiros e retirada do lixo respectivo durante toda a jornada.

Logo, o direito em discussão foi criado não pela norma regulamentar (NR), como explanado anteriormente, mas por meio de súmula, em flagrante ofensa ao disposto no art. 8º, §2º, da CLT, motivo já suficiente para deflagrar ilegalidade e, ainda, uma incostitucionalidade reflexa, pois, é consabido que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, razão pela qual entende-se pela sua inaplicabilidade à situação fática dos agentes higienizadores em locais de grande cirulação, justamente pela ausência de substrato legal.